quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

Metrô Ana Rosa


Tu paras diante dos poemas nas estações de metrô.

Joga de lado o que corre no dia

E deixa os olhos correrem por poemas.

‘O mistérios das cousas, onde está ele?’

É preciso ter coragem pra descobrir.

Quando penso em gestos de coragem logo você me vem a mente.

Me assusta e penso que parar não posso,

A não ser para fazer o mesmo que você:

Parar em frente a uma escada, com as pessoas querendo subir e descer

E ler uma poema como esse:


'O mistério das cousas, onde está ele?

Onde está ele que não aparece

Pelo menos a mostrar-nos que é mistério?

Que sabe o rio disso e que sabe a árvore?

E eu, que não sou mais do que eles, que sei disso?

Sempre que olho para as cousas e penso no que os homens pensam delas,

Rio como um regato que soa fresco numa pedra.



Porque o único sentido oculto das cousas

É elas não terem sentido oculto nenhum,

É mais estranho do que todas as estranhezas

E do que os sonhos de todos os poetas

E os pensamentos de todos os filósofos,

Que as cousas sejam realmente o que parecem ser

E não haja nada que compreender.



Sim, eis o que os meus sentidos aprenderam sozinhos: -

As cousas não têm significação: têm existência.

As cousas são o único sentido oculto das cousas.'

O Mistério das Cousas. Fernando 'Alberto Caeiro' Pessoa.


Talvez, parar em frente a escada, seja um gesto seu delicado de dizer as pessoas: curta esse agora.



segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

Como voltar?


Começo a escrever porque deitei na cama sem saber o que fazer? Olho para os livros espíritas ao lado da minha cama, penso em abri-los – tentei ontem – mas estou num momento em que me digo ‘esqueci como orar’. Na verdade não estou sabendo como começar. Um livro que seja, um desenho que me distraia por algumas horas, encarar problemas, aceitar desafios... Na verdade, não estou sabendo voltar. Não encontro poesia nas palavras, nem nos lugares pros quais olho, nem dentro de mim querendo brotar. Estou sem saudade do meu cotidiano. Saudade nenhuma, uma vontade de dizer ‘adeus, cotidiano’, você existiu até aqui e... não virá um cotidiano novo depois?
Pensei em alguns momentos refugiar-me num livro. Cinzas do Norte, do Milton Hatoum, sem ver a cor dos meus olhos e minha atenção há duas semanas. Há duas semanas refugiei-me num apê na Vila Mariana. Na verdade eu deveria ter ido apenas cuidar de duas cachorras e ficar mais tempo com meu namorado. Mas aproveitei e refugiei-me. De um eu com problemas financeiros, de um eu com problemas em casa, de um eu que não consegue, já faz alguns muitos meses, orar. Orações me são caras, mas as silenciei em mim. Não é uma revolta contra Deus e a questão não é Deus... é essa conexão a tudo que a de bom no Universo a que tento me conectar quando oro. Os anjos mais elevados, as almas boas que caminham pela minha casa e não vejo, mas percebo sua aproximação quando paro este tudo do dia a dia e me conecto a elas. Para um ‘obrigado’, para um ‘olha, o problema é este’, para uma pergunta. São muitas e hoje era nenhuma. Por que me refugiei? Por que caí no chão chorando na hora de vir pra casa, perguntando a duas cachorras o que deveria fazer? Pedindo lições. Lições de quê? Lições caninas?
Vai brotando palavra de mim tentando encontrar poesia ao meu redor e não acho. Penso que encontrar poesia, mesmo nos problemas, é uma maneira de encontrar uma forma de vida que vale à pena. Machuca, mas faz sentido. Estou sem conseguir sorrir e sem querer papo aqui em casa. Há meses atrás, indo a federação espírita, me pediram para fazer um tratamento espiritual dedicado a família. Pareceu fazer sentido diante de tudo o que eu tinha falado. Consegui assistir uma única palestra das treze que deveria e a esta altura do campeonato nem mais sei onde está o meu cartão de acompanhamento. Eles sempre somem e eu nunca consigo preenchê-los. Há quatro anos, pelo menos, frequento a federação, e nunca consegui terminar a já pelo menos uma dezena de tratamentos espirituais que comecei. O que acontece comigo que tenho o hábito de correr pra longe do que busco? Parece-me que dar a volta ao mundo até achar o ponto que ficou pra trás não faz sentido. Até porque quando chegar, já estarei em outra busca.
Sinto hoje o tempo parado e correndo ao mesmo tempo. Já dizia a Cleide lá em 2007: tempo é espaço interno, espaço é tempo externo. Que tempo é esse dentro de mim que hoje passa? Que espaço é esse que dentro de mim para? Eu terminei de assistir Sense8 hoje – ouvi dizer que pessoas que assistem seriados são pessoas que se sentem só. Pensei nisso quando comecei a procurar outra série pra assistir. Fugi delas assistindo um documentário sobre a Beyonce, não que eu goste muito, mas ajudaria a passar o tempo sem pensar demais. E o tempo passou e já é noite. E continuo tentando entender como voltar. Baixei há alguns dias um aplicativo que uso para listar as coisas que tenho para fazer ao longo do dia. Hoje tentei usá-lo e não consegui listar nada. Como se nada houvesse a fazer. Mas sempre há e hoje... esse espaço parado e ramificações daquela dor de ontem, dor da volta do refúgio.
O ano começou a pouco e minha nova idade também. E as coisas novas todas também. E não consigo vê-las e ser grato, agradecer ao Universo, a essas pessoas invisíveis que moram na minha casa. Talvez listar as receitas que cozinhei para o Jhonny nestas duas semanas e tomar nota do que deu certo, organizar as fotos desses dias e pensar que não foram os últimos. Presságio de dias futuros em que a gente constrói junto. Talvez more nessa dificuldade de volta a descoberta que sou apenas parte de um todo que é dois. A outra parte é bagunceira, deixa a roupa suja misturada com a roupa limpa, não escova os dentes quando acorda, toma café da manhã com remela no olho, não me ajuda a limpar a casa e passa horas no celular. Também a outra parte tem um sorriso enorme, uma vontade de abraçar o mundo, e uma vontade de ser abraçado pelo mundo... talvez, de já há algum tempo e de lá pra frente – e só cai a ficha agora – devo entender que os meus movimentos enquanto parte, é buscar caminhos para o nosso todo estar mais vezes como nessas duas últimas semanas: completinho.
Acho que agora rolou um impulso de tentar ainda hoje uma coisa qualquer que conecte meus tempos e espaços. Internos e externos. Talvez não seja volta, e sim recomeço.