Oi. Pensei em lhe
dizer algumas coisas. Por isto fiz o óbvio. Tranquei-me no quarto, cobri o espelho,
apaguei a luz, e lhe disse para eu ouvir: Até lhe conhecer eu era um. Eu era um
até saber que namoro é mais complicado que essas imagens que a gente pinta de
adolescente. Eu era um enquanto achava que beijo é só beijo, aqui e ali é só
beijo. Eu era um até descobrir que você chega da rua, me beija, e tem sempre
gosto de bala de cereja. Da última vez foi aqui no rosto, o beijo sem gosto.
Que difícil beijo na bochecha, eu disse. Eu era um até o dia que dei pra você.
E apesar de serem estes os verbos, dar, comer... eu era um até descobrir que de
algum jeito a gente se dava um para o outro. Eu era um, sozinho, dormindo
abraçado a sua regata vermelha. É só uma regata sem ouvidos, não adianta chamar
ao pé do tecido, você não volta. Eu era um até descobrir que aquele filtro de
sonhos pendurado na parede, estava retendo sonhos, prendendo-os em seus fios
trançados, porque só podia... só passa pesadelo. Não me olha desse jeito porque
eu tenho vergonha, eu disse. Você não tem vergonha na cara? Eu disse. Eu era um
até amarrar meu burro em você. Eu era um sentado numa mesa de bar, sendo o
filho da puta que aprendi a ser com você. Eu era um aqui reunido, na
congregação, com o álcool, para bater um papo. No que me falta, uma catuaba,
por favor. Com gelo, pra eu e ela, a catuaba, bater um papo cuca fresca. Eu era
um até descobrir a catuaba. Virei num gole só. Moral da história: Amarrei meu
burro num cubo de gelo. Derreteu e agora estou livre.
31.12.2015
(Texto escrito a pedido de um amigo.)